segunda-feira, setembro 30, 2013

Sobre as autárquicas

É muito difícil fazer leituras nacionais de umas eleições locais, mas é grande a tentação. É por isso que muitos nos querem convencer que foi uma verdadeira onda rosa que varreu o continente na noite de ontem. Nada mais errado.

1. Indo às capitais de distrito, o PS perdeu câmaras importantes para o PSD (Guarda e Braga) e outras para a CDU (Évora e Beja). Ganhou Coimbra e Leiria, mas não conseguiu ganhar as câmaras de Santarém e de Faro ao PSD. Foi brilhante? Longe disso.

2. Em Lisboa, a vitória estrondosa de António Costa é a de uma candidatura que, ouvi repetir várias vezes ontem, é PS+. É do PS sim, mas é mais do que isso. É dos independentes e é da oposição a António José Seguro (cometesse ele os erros primários da direcção do PSD e outro teria sido o candidato em Lisboa). É sintomático que a vitória mais evidente do PS seja a do adversário do actual líder (o qual não vi passar pelo Altis). É sintomático que o discurso de vitória de Costa seja mais nacional do que local. Se eu fosse Seguro estaria preocupado.

3. No Porto o PS não conseguiu, sequer, capitalizar a divisão das hostes de Direita entre as candidaturas de Menezes e de Rui Moreira. O PS foi reduzido à sua insignificância na segunda cidade do país, quando tinha a mais do que evidente obrigação de ganhar.
 
4. Gaia e Sintra são mais dois tristes exemplos da vitória de pirro do PS. Os candidatos do PSD somados (havia dois em cada um dos municípios) têm mais votos do que os socialistas agora eleitos presidentes da Câmara. Será preciso dizer mais?
 
 
Tudo isto nos leva à segunda grande questão: foi a derrota do PSD assim tão grande? Foi e não foi.
 
1. Foi enorme, gigantesca mesmo, a derrota de um certo PSD. O PSD das escolhas erradas, dos "meninos do chefe", dos "trânsfugas municipais". Com isso perderam Sintra e Gaia. E o Porto também. No distrito de Lisboa o PSD ficou reduzido a duas câmaras. Muito curto para sustentar as clientelas. No Porto o terceiro lugar de Menezes e o desaire em Gaia deviam ter consequência. Resta saber se soprarão ventos de mudança nas distritais do PSD.
 
2. Mas, se pensarmos que o PSD está no Governo há 2 anos, a levar a cabo um programa de ajustamento duríssimo e a aplicar medidas muito pesadas aos Portugueses, e depois olharmos para o mapa autárquico, vemos que a derrota não é avassaladora. Ou melhor, a vitória do PS ao não o ser, verdadeiramente, atenua (e muito) os estragos causados ao PSD.
 
3. Concluo, assim, que o PSD foi mais penalizado pela sua inábil gestão autárquica e pelas suas escolhas infelizes do que pela governação. Os eleitores não deram uma vitória ao PS. Os eleitores castigaram as más escolhas do PSD nos seus concelhos. Tivesse o PSD feito uma inteligente gestão autárquica e hoje a situação poderia ser bem diferente.
 
 
Mas resumir as autárquicas a PSD e PS é curto. Porque relativamente ao CDS, PCP e BE há bem mais a notar.
 
1. O CDS foi um dos claros vencedores da noite. Aumentou o número de Câmaras (quintuplicou, mais exactamente), aumentou o número de mandatos autárquicos, manteve-se nas coligações que entendeu serem projectos de continuidade e soube distanciar-se da desastrosa candidatura de Menezes no Porto. O que o PSD teve de inabilidade, o CDS teve de inteligência na gestão do dossier autárquico e foi premiado por isso.
Se a coligação governamental foi penalizada, como o PS e a esquerda em geral nos querem fazer crer, como explicar o sucesso do CDS, ao apresentar-se com o seu símbolo e as suas cores e, ainda assim, a conquistar 5 Câmaras? E o sucesso de tantas das coligações PSD+CDS por esse país fora?
 
2. O segundo vencedor da noite foi o PCP. Recuperou espaço (à custa do PS, convém recordar, não vá algum leitor mais distraído achar que foram roubar votos à direita directamente!) e reconquistou o Alentejo. Pela primeira vez o discurso de vitória não soou a falso. Algum dia tinha que acontecer
 
3. Nota fundamental: o BE foi varrido do mapa. Perderam a única câmara que tinham e não conseguiram eleger vereadores nem em Lisboa, nem no Porto. Um desastre colossal. Uma hecatombe muito maior do que aquela que disseram ter sido imposta aos partidos do Governo! É a vida, e a do BE não está fácil...
 
 
Análises dos partidos à parte, uma nota à vitória de Rui Moreira no Porto. É a vitória das contas certas e da seriedade. É também uma extraordinária vitória de Rui Rio que ganha pontos no PSD (tal como António Costa no PS). Distanciou-se da actual direcção, manteve-se atento e cauteloso e ontem decerto que teve motivos para sorrir. Resta saber o que irá fazer com o capital acumulado.
 
Resumindo, ficam 6 conclusões: (1) o PSD pagou o preço das suas más escolhas; (2) os eleitores castigaram os candidatos salta-pocinhas; (3) o PS não soube (ou não pode) capitalizar as inúmeras fragilidades do seu adversário mais directo e construir uma verdadeira vitória; (4) o BE foi pulverizado de uma forma exemplar, demonstrando que o seu discurso já não encanta ninguém; (5) o Porto deu, mais uma vez, um excelente exemplo de independência e de liberdade; e (6) os líderes do PSD e do PS passam a dormir menos descansados.
 
Quanto a leituras nacionais é tudo. Depois há Oeiras...