segunda-feira, março 28, 2005

Homem Cognac

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É o ‘bon vivant’ da adega! Geralmente é do tipo que fuma charuto, joga golf e adora carros desportivos! Sabe que é irresistível à vista e joga com o seu charme e com a imagem de poder que passa para os que o rodeiam! É daqueles homens que faz género e posa para a fotografia! Grande parte da sua imagem é totalmente construída para o exterior e quando o conhecemos temos uma desilusão profunda! É geralmente um regalo para os sentidos, mas conhecê-lo é a ‘morte do artista’.

2 comentários:

Anônimo disse...

Talento em estado líquido. Bebe-se com prazer.
Parabéns.

Anônimo disse...

É grande, mas está muito bom. Não tem a haver com vinho, mas deixa-nos tontos. É para ti.


Miguel Esteves Cardoso

In "Expresso"

"Há coisas que não são para se perceberem. Esta é uma delas. Tenho uma
coisa para dizer e não sei como hei-de dizê-la. Muito do que se segue pode
ser por isso, incompreensível. A culpa é minha.


O que for incompreensível não é mesmo para se perceber. Não é por falta de
clareza.Serei muito claro. Eu próprio percebo pouco do que tenho para
dizer. Mas tenho de dizê-lo. O que eu quero é fazer o elogio do amor puro.
Parece-me que já ninguém se apaixona de verdade. Já ninguém quer viver um
amor impossível. Já ninguém aceita amar sem uma razão. Teixeira de Pascoaes meteu-se num navio para ir atrás de uma rapariga inglesa com quem nunca tinha falado. Estava apaixonado, foi parar
a Liverpool. Quando finalmente conseguiu falar com ela, arrependeu-se.

Quem é que hoje é capaz de se apaixonar assim?Hoje em dia as pessoas apaixonam-se por uma questão prática. Porque dá jeito. Porque são colegas e estão mesmo ali ao lado.Porque se dão bem e não se chateiam muito. Porque
faz sentido. Porque é mais barato, por causa da casa.Por causa da cama. Por causa das cuecas e das calças e das contas da lavandaria.Hoje em dia as
pessoas fazem contratos pré-nupciais, discutem tudo de antemão, fazem planos e à mínima merdinha entram logo em "diálogo". O amor passou a ser
passível de ser combinado. Os amantes tornam-se sócios.Reunem-se, discutem problemas tomam decisões. O amor transformou-se numa variante
psico-sócio-bio-ecológica da camaradagem. A paixão que devia ser desmedida é na medida do possível. O amor tornou-se uma questão prática.O resultado é
que as pessoas, em vez de se apaixonarem de verdade ficam "praticamente"
apaixonadas.

Eu quero fazer o elogio do amor puro, do amor cego, do amor estúpido,do amor doente, do único amor verdadeiro que há, estou farto de
conversas,farto de compreensões, farto de conveniências de serviço.Nunca vi
namorados tão embrutecidos, tão cobardes e comodistas como os de hoje.
Incapazes de um gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de ousadia,são uma raça de telefoneiros e capangas e cantina, malta do "tá em,tudo
bem", tomadores de bicas, alcançadores de compromissos, bananóides,
borra-botas, matadores do romance, romanticidas.Já ninguém se apaixona? Já
ninguém aceita a paixão pura, a saudade sem fim a tristeza, o
desequilibrio, o medo, o custo, o amor, a doença que é como um cancro a
comer-nos o coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo?


O amor é uma coisa a vida é outra. O amor não é para ser uma ajudinha. Não
é para ser o alívio, o repouso, o intervalo, a pancadinha nas costas, a
pausa que refresca,o pronto-socorro da turtuosa estrada da vida, o nosso
"dá lá um jeitinho sentimental".Odeio esta mania contemporânea por sopas e
descanso. Odeio os novos casalinhos. Por onde quer que se olhe, já não se
vê romance, gritaria, maluquice, facada, abraços, flores. O amor fechou a
loja. Foi trespassado ao pessoal da pantufa e da serenidade. Amor é amor. É
essa a beleza. É esse o perigo. O nosso amor não é para nos compreender,
não é para nos ajudar, não é para nos fazer felizes.Tanto pode como não
pode. Tanto faz. É uma questão de azar. O nosso amor não é para nos amar,
para nos levar de repente ao céu, a tempo ainda de apanhar um bocadinho de
inferno aberto. O amor é uma coisa a vida é outra. A vida às vezes mata o
amor. A "vidinha" é uma convivência assassina.


O amor puro não é um meio, não é um fim, não é um princípio, não é um
destino. O amor puro é uma condição. Tem tanto a ver com a vida de cada um
como o clima. O amor não se percebe. Não é para se perceber. O amor é um
estado de quem se sente. O
amor é a nossa alma. É a nossa alma a desatar. A desatar a correr atrás do
que não sabe, não apanha, não larga, não compreende. O amor é uma verdade.
É por isso que a ilusão é necessária. A ilusão é bonita não faz mal. Que se
invente e minta e sonhe o que quiser. O amor é uma coisa a vida é outra. A
realidade pode matar, o amor é mais bonito que a vida. A vida que se lixe.


Num momento, num olhar, o coração apanha-se para sempre. Ama-se alguém. Por
muito longe, por muito difícil, por muito desesperadamente. O coração
guarda o que se nos escapa das mãos. E durante o dia e durante a vida,
quando não está lá quem se ama, não é ela que nos acompanha - é o nosso
amor, o amor que se lhe tem. Não é para perceber. É sinal de amor puro não
se perceber, amar e não se ter, querer e não guardar a esperança, doer sem
ficar magoado, viver sozinho, triste, mas mais acompanhado de quem vive
feliz. Não se pode ceder. Não se pode resistir. A vida é uma coisa e o amor
é outra. A vida dura a vida inteira, o amor não. Só um mundo de amor pode
durar a vida inteira.
E valê-la também."