Estas notícias não são, por si
só, más ou boas. Isto porque o nível de desenvolvimento de um país não se pode
medir, apenas, pelo número de licenciados, mestrados ou doutorados. Ainda a
semana passada tinha esta conversa à volta de um brunch: o que o 25 de Abril fez foi criar a ilusão de que seria
pelo “canudo” que se aboliriam as barreiras sociais, então ainda muito presentes
na sociedade portuguesa.
Assim, a educação não era
importante por si, pelo que, de facto, representa para o desenvolvimento individual,
mas pelo estatuto social que supostamente a licenciatura (o canudo) garantiria.
Por isso mesmo, depois da revolução, fecharam-se aquilo a que hoje chamaríamos os
cursos técnico-profissionais e criou-se a ilusão – porque foi mesmo isso – de que
seríamos um país de “Senhores Drs”. E, daí decorria que quem não tivesse o Dr. antes
do nome, não tinha valor. Durante uns tempos se calhar isto até funcionou, mas
haveríamos de chegar ao ponto de ruptura e de saturação. Hoje há licenciados a
mais e bem que podemos gritar que somos a geração mais preparada de sempre –
seremos mesmo? – que não é isso que nos vai garantir nem o emprego, nem o
trabalho, nem o salário ao fim do mês, nem a felicidade ou a realização.
Mas foi esta a sociedade que criámos, ao não dar valor às
pessoas pelo que elas são, mas apenas pelo que elas têm. Há uns anos era o “canudo”,
tal como hoje é o carro ou o telefone de última geração. São tudo alavancas
sociais numa sociedade que ainda não cicatrizou feridas e ainda vive uma luta de
classes latente. Sem perceber que não é a profissão que determina o que cada
pessoa é e o seu valor social (será que existe mesmo um valor social da pessoa?).
Sem ver que tanto são importantes os que estudam medicina, economia, direito,
filosofia, engenharia, história, física ou matemática, como aqueles que, sem
tal conhecimento académico, desempenham profissões de igual dignidade e de vital
importância. Um médico não é mais do que um cozinheiro. Um advogado não é mais
do que um sapateiro. Um arquitecto não é mais do que um electricista. Antes
pelo contrário. Um mau médico, um mau advogado ou um mau arquitecto deverão ser
menos valorados pela sociedade – pelo que dão à comunidade - do que um excelente
cozinheiro, um excelente sapateiro ou um excelente electricista.
Nada disto pretende reduzir a educação a uma elite que “pode”.
Antes pelo contrário. O problema é infinitamente mais complexo do que isso. A
educação deve estar acessível a todos, naturalmente, mas deve ser
disponibilizada de acordo com as aptidões, capacidades e sonhos de cada um. Deve
ser dado igual valor à vertente académica e profissional. Os cursos
profissionais não devem estar reservados àqueles meninos que o “sistema” não
quer e de quem não gosta. A educação deve ser de facto uma ferramenta ao
serviço das pessoas e da comunidade que serve e deve olhar às necessidades, às
capacidades e à vocação – porque não - de cada criança, dizendo-lhe, desde o
início que a sociedade precisa de todos por igual e precisa de pessoas
competentes e com sólida formação – académica, práctica e profissional – em todas
as áreas.
Nenhuma cidade sobreviveria só com advogados – mal seria! – assim como
nenhuma cidade viveria sem um padeiro. De uma vez por todas, metam na cabeça
que não é o Dr. que nos faz ser o que nós não somos e não é isso que devemos
valorizar nos outros. Devemos valorizar, isso sim, a competência, a curiosidade
intelectual, a capacidade e o brio de querermos ser os melhores nas tarefas que
desempenhamos, sejam elas quais forem. Porque só isso tem valor. E antes ser o
melhor padeiro da minha rua do que o advogado mais incompetente (e infeliz!).
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