A grande discussão do momento na UE passa, em grande parte,
pela emissão conjunta de dívida soberana: as célebres eurobonds – também chamadas stability
bonds. Mas o que são, afinal? São obrigações da dívida que ao invés de
serem emitidas por um Estado, são emitidas pelo conjunto dos Estados da zona
Euro e como tal garantidas por todos. Naturalmente que, comunitarizando a
dívida, o preço do dinheiro baixa e as dúvidas sobre o cumprimento individual
de cada Estado se dissipam.
É esta uma boa solução? É e não é. Vejamos:
(1) É uma boa solução na medida em que significa um avanço
significativo na construção da União Económica e Monetária e evitará que, no
futuro, se criem as condições para uma crise de dívidas soberanas como aquela
que atravessamos, na medida em que retirará pressão sobre os Estados
periféricos, fortemente penalizados pelas dúvidas dos mercados quanto à sua
capacidade de cumprir as obrigações assumidas e pagar as dívidas.
(2) Não é uma boa solução, já, por vários motivos: (i) não é um
mecanismo de resolução de crises e, como tal, não consegue, a curto prazo,
resolver o problema actual; (ii) não pode ser implementada de imediato; (iii)
sem medidas de acompanhamento, levaria ao descalabro que vimos acontecer com o
Euro, o qual criou a ilusão de dinheiro fácil (e barato) para todos.
Posto isto, sou eu a favor ou contra? A favor. A minha
opinião vai, no essencial, ao encontro do caminho apresentado pelo Presidente
da Comissão no seu último discurso sobre o Estado da União: este só pode ser no
sentido de mais integração, de maior aprofundamento e de mais solidariedade.
Quer isto dizer que se deva avançar, já, para a emissão conjunta de dívida?
Não. Este ainda não é o momento, e temo que se tal fosse feito, agora, as
consequências poderiam ser devastadoras. Já hoje citei o artigo de José Manuel
Fernandes no qual ele fala das ilusões que foram criadas pelo Euro, na década de
90. Com as eurobonds seria descalabro
semelhante. Estados que não estão habituados ao cumprimento das regras e que
ainda não se aperceberam bem do que lhes aconteceu, olhariam para as eurobonds como o fim da sua
responsabilidade individual. É por isso que a Alemanha se opõe a esta hipótese
com unhas e dentes! Porque teme que emissão conjunta signifique, na prática,
responsabilidade alemã. E não é isso que tal comunitarização significa.
Por isso mesmo, emissão conjunta de dívida e união
orçamental (poderíamos chamar-lhe união política) são duas faces da mesma
moeda. Não pode haver responsabilidade solidária sem existir controlo ex-ante das opções individuais dos
Estados. Não pode haver responsabilidade solidária sem existir um mais eficaz e
rigoroso governo económico para os Estados do Euro. E isso, não podemos ter
ilusões, representará sempre a perda de alguma parte da soberania. Porque na UE
como na vida, não podemos querer ter só a parte boa. Ao alívio da
responsabilidade vem acoplada a perda de alguma liberdade. Porque se o queremos
é ser livres de seguirmos o nosso caminho, então teremos que ser responsáveis
únicos por ele. Não podemos estar num projecto que envolve mais 16 Estados e
não podemos querer que, quando na nossa liberdade erramos, sejam os outros que
nos venham ajudar a emendar o nosso erro. Na UE, como na vida, liberdade e responsabilidade
andam sempre de mãos dadas. E aqui a escolha é só uma: queremos
responsabilidade partilhada ou não? E para isso estamos disponíveis para
abdicar de alguma da nossa liberdade?
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