Como, decerto, em muitos outros países um dos problemas de Portugal são as
leis. Lamento dizer isso, depois de ter passado 5 anos da minha vida a
estudá-las, e mais outros tantos a usá-las, mas começo a ser forçada a concluir
isso mesmo.
Vejamos. Em Portugal, há vários tipos de leis:
- as que foram feitas para não serem cumpridas e a que todos fecham os
olhos (lembro-me das leis de protecção ambiental, que só servem mesmo para
impor restrições ao cidadão comum mas que, constantemente, “caem” quando se
fala de grandes projectos – caso Freeport, por exemplo);
- as que foram feitas para proteger determinados interesses de classe, de
grupo ou de agremiação (lembro-me da lei aplicável às equivalências);
- as que foram feitas sem qualquer razão aparente, sem justifição e sem sentido
(bem, aqui haveria milhentos exemplos, e qualquer cidadão que tenha o mais
pequeno contacto com o universo jurídico sabe bem do que falo);
- as que deveriam existir e pura e simplesmente não interessam a ninguém (por exemplo, um limite legal para o endividamento do Estado, sei lá!)
Pois bem, o problema é mesmo das leis. As que não se cumprem e que deveriam
ser cumpridas. As que se cumprem e nunca deveriam ter sido aprovadas. As que se
impõem, não tendo qualquer razão de ser. E as que deviam existir mas ninguém as
quer fazer. E isto, meus caros, isto é o atraso português
O atraso dos cidadãos que são impedidos de seguirem com a sua vida,
desenvolverem os seus projectos, fazerem os seus investimentos, porque há toda
uma gincana de leis, regulamentos, regras e despachos que tem que ser
ultrapassada ou contornada. No caminho, vários desistem. Outros vão fazer o que
queriam para outras paragens, onde a legislação é mais amiga do investimento,
do trabalho e da iniciativa.
O atraso dos projectos que são aprovados contra a lei, apenas porque há interesses injustificáveis que, afinal, o justificam. Construir um centro comercial em zona protegida? Pois claro! Construir uma barragem em local de património classificado? Siga! Porque não? Há milhões a correr, a economia a crescer e, dizem as más línguas, alguns bolsos a encherem-se.
O atraso do “amiguismo” e da “cunha” que muitas vezes tem consagração
legal, porque a lei, que aprendi ser geral e abstracta, às vezes é feita a
régua e esquadro para se aplicar apenas a um universo restrito e, a este,
garantir o que, de outro modo, seria impossível, inaceitável e, em muitos
casos, pouco ético.
O atraso de se criar um emaranhado tal de leis, regulamentos, despachos,
ofícios e tudo o mais que o Estado deita cá para fora de forma veloz, e que
estrangula tudo pelo caminho. Temos o magnífico exemplo da ASAE, com todas as
suas regras absurdas que, afinal, e pasme-se (!), não foram importadas da
Europa mas são invenção nacional. (Basta viver em Bruxelas para perceber que a
ASAE entrava aqui e seria o fim de todo e qualquer restaurante ou bar belga).
O atraso de não se regular o que seria fundamental em qualquer estado de direito democrático, sejam os limites a que o poder político está sujeito (e estes não deveriam ter que ser impostos de Bruxelas), seja a responsabilização desse mesmo poder político perante a lei.
E é por isto que chegámos onde chegámos no atraso, na impunidade, na
irresponsabilidade, na falta de vontade de fazer alguma coisa diferente. É por
isso que esse mesmíssimo Estado, que tantas vezes foi burlado e saqueado,
continua a permitir a impunidade de quem o fez e de quem o permitiu.
Parafraseando a famosa expressão de Marcelo Rebelo de Sousa, o nosso
problema é tudo o que sendo ilegal se pode, afinal, fazer, e tudo o que não se
pode fazer mas que deveria ser legal.
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