quarta-feira, janeiro 23, 2013

O inefável "Estado Social"

Aqui há uns anos a Suécia começou a implementar uma série de reformas que permitiram garantir a sustentabilidade da segurança social, melhorar a educação e a saúde. 

Sem "matar" o Estado Social, a Suécia avançou com reformas inovadoras que passam (sem entrar em pormenor) pela criação de um sistema de duplo pilar na segurança social (só 50% das pensões é garantida pelo Estado, sendo o remanescente da responsabilidade de entidades privadas e a parte "pública" do sistema é gerida em sistema de conta-corrente); pela introdução do famoso cheque-ensino, garantindo liberdade de escolha para as famílias, autonomia para as escolas e concorrência no mercado, o que aumentou a qualidade do ensino (e, consequentemente, os resultados dos alunos); e pela privatização gradual dos serviços de saúde, que passaram a funcionar numa lógica em tudo semelhante ao cheque-ensino, numa espécie de sistema de vouchers.

Tudo isto foi feito mantendo o "consenso social" e a percepção geral do Estado Social sueco como um dos mais completos do mundo. Este exemplo, pelo menos, deveria merecer a nossa atenção e estudo.

Os mercados

O regresso de Portugal aos mercados não é um fim em si mesmo, mas a operação de hoje, que permitiu a colocação de 2,5 mil milhões de euros com juro inferior a 5%, é um excelente sinal. Quer dizer que, aos poucos, estamos menos dependente da ajuda externa e que poderemos, em breve, deixar as "saias" da Troika e viver por nossa conta.

Porém, mais importante do que Portugal se voltar a financiar no mercado (sem precisar de pedir "ajuda") a juros decentes (embora, recorde-se que a taxa muito superior àquela que nos é cobrada pela Troika), é saber o que vamos fazer com isso. Isto porque o regresso aos mercados, sem uma verdadeira reforma do Estado e sem uma nova política relativamente à emissão de dívida, de nada vale.

Só espero que, depois da Troika e dos sacrifícios, tenhamos, de facto, aprendido a lição. Caso contrário, tudo não terá passado de um intervalo de austeridade numa espiral de dívida. E, não tenhamos ilusões, as mesmas políticas, ainda que separadas por anos, darão sempre os mesmos resultados. Se queremos quebrar o ciclo do endividamento excessivo, do crescimento nulo e da falta de competitividade temos que mudar de políticas e abandonar o socialismo. Temos mesmo que mudar de vida. E, já agora, ainda que seja pedir de mais, mudar de Constituição!

quinta-feira, janeiro 10, 2013

O infame FMI

Eu li o Relatório do FMI, inteirinho, do princípio ao fim. É um bom documento de trabalho que faz uma análise séria do que é o "monstro". Faltam ali algumas coisas, mas muitos dos nossos problemas estão ali bem retratados.

Como método de trabalho, à medida que lia o Relatório, fui construindo uma tabela. De um lado ia pondo as medidas positivas e do outro as medidas negativas. Cheguei ao fim com a primeira coluna cheia e a segunda com nem meia dúvida de chavões assustadores - cortes cegos nas pensões, subida genérica das taxas moderadoras ou despedimentos generalizados de professores.

São ideias, em si, assustadoras, obviamente. Ninguém de bom senso defende um corte de 20% numa pensão de duzentos e poucos euros. Como ninguém com o mínimo de preocupação social defende o aumento generalizado das taxas moderadoras para todos.

Daí a rasgar as vestes dizendo que o Relatório mata o Estado Social (o Relatório não mata nada, desde logo porque não é lei nem regulamento, é apenas um documento consultivo de carácter técnico) e que é o demónio encarnado, parece-me pouco sério.

Desde logo, como disse, este é um documento que lança sugestões, as quais terão que passar pelo crivo político do Governo e do Parlamento. Depois, porque para além de 3 ou 4 propostas mais "assustadoras", o que o Relatório nos dá é uma visão bastante esclarecedora de alguns dos motivos pelos quais chegámos aqui.

Há funcionários públicos a mais? Claro que há! Dizia-me aqui há uns tempos alguém que conhece bem a máquina da Administração que, se calhar, temos 30% a 40% de funcionários a mais (numa estimativa conservadora).

Os funcionários públicos eram uma classe privilegiada face aos trabalhadores do sector privado (CGA, ADSE, horário de trabalho, estabilidade labora´l, etc)? Claro que eram e ninguém o pode negar. E, a ver pelo Relatório do FMI, apesar dos cortes, continuam a ser.

Há classes claramente privilegiadas dentro do Estado (juízes, militares, diplomatas e magistrados)? Claro que há! E faltarão aí com certeza mais umas quantas classes com benefícios que nós nem sonhamos e que nunca deveriam ter existido!

Há professores a mais (e já agora escolas a mais) para um país com a mais baixa taxa de natalidade da Europa? Obviamente que há! Vamos continuar a diminuir o número de alunos por turma até termos um professor para cada criança?

O sistema que permite que a média das pensões da CGA seja de 16.000 euros/ano e na Segurança Social seja de apenas 5.500 euros/ano é justo? Claro que não! E só assim é porque vivemos anos e anos de abusos com funcionários públicos a reformarem-se com os ordenados de Directores Gerais ou Subdirectores e porque há categorias profissionais com "esquemas" escandalosos de reforma (é que nem é preciso falar dos políticos!).

O sistema de saúde gratuito para todos faz sentido? Não! Deve ser absolutamente gratuito para quem tem muito pouco e deve ser pago, de forma progressiva, por quem tem rendimentos mais altos. E, a partir de um certo tecto de rendimentos, deve ter um custo equivalente ao custo que a prestação dos mesmos cuidados teria no privado.

Faz sentido que o Estado mantenha um sistema público de educação quando no ranking das 50 melhores escolas apenas duas (repito, DUAS) sejam públicas? Não! Dê-se autonomia às escolas e liberdade aos pais, calcule-se o custo por aluno e implemente-se um sistema de cheque ensino.

Todos estes são exemplos que provam que o que o Relatório do FMI (já infame) não é disparatado e não é o coveiro nacional. Contém uma boa análise da situação de base e apresenta algumas boas soluções.

É impossível pensarmos numa reforma do Estado (ou refundação) que não mexa na função pública, nas prestações sociais, na saúde e na educação. Os cortes serão duros mas são necessários. Não podem ser cegos, mas devem promover uma verdadeira justiça social. O Estado tem que se reduzir ao essencial e retirar-se de inúmeros sectores onde os privados fazem mais e melhor (e por menos dinheiro!). Assim, poderá canalizar recursos para as suas funções essenciais (que passará a prestar de forma mais eficaz e mais eficiente) e reduzir o peso dos impostos, libertando assim a economia, as famílias e as empresas.

Por fim, o que o Relatório do FMI esquece (porque, porventura, não lhe foi pedido que se debruçasse sobre isso) são, nomeadamente, os anos e anos de má gestão dos recursos públicos (os nossos impostos) canalizados para obras megalómanas que serviram para encher os bolsos de alguns; a pequena corrupção; as corporações e o amiguismo que parasita o Estado; o desperdício e a gestão danosa; os privados que vivem à conta e por conta do Estado; as empresas públicas ou quase públicas que são sorvedouros de recursos e todos os demais cancros do nosso Estado, os quais são já bem conhecidos. E estes cancros têm que ser extirpados, sob pena de nos continuarem a matar, lentamente, bem para lá da dieta imposta.

quarta-feira, janeiro 09, 2013

Paradoxo

Se fazer o "ajustamento" pelo lado da receita (impostos) todos criticam e se fazê-lo pelo lado da despesa (com ou sem receita FMI) é matar o Estado Social, violar a Constituição e mais três mil e quinhentas coisas terríveis e abomináveis, que tal não se fazer ajustamento algum e continuarmos a viver à grande até vir alguém apagar a luz (sem pagar a conta)?*




* Vem isto a propósito das várias reacções ao Relatório do FMI.


sábado, janeiro 05, 2013

O fascínio da televisão



Pese embora reze a história familiar que comecei a andar no dia em que uma TV a cores chegou lá em casa, a verdade é que também sempre ouvi que, desde pequena, nunca achei especial graça à televisão.

Lembro-me, porém, de ficar fascinada a ver a mira técnica (acho que acompanhada de música clássica, mas não posso garantir) e de pouca atenção prestar aos desenhos animados. Curiosamente, até hoje a mira técnica é uma imagem que me fascina. Talvez porque representa a tecnologia que permite que um pequeno aparelho nos traga som, imagem e cor, o que é algo de absolutamente fabuloso. Uma tecnologia que nos permite estar em “directo” com o resto do mundo e receber informação, entretenimento e cultura em tempo real é algo com que os nossos bisavós poderiam apenas sonhar (e com certeza tanto sonharam que fizeram do sonho uma realidade). E o que fizemos nós com ela? Transformámos esta extraordinária invenção humana em lixo.

Para mim, a televisão (no que ela hoje significa, com os seus talk shows, reality shows e todos os demais shows que não têm ponta de interesse ou graça) só pode estar desligada e mantida assim. Ver alguns dos programas que preenchem os mil canais com que os mais completos pacotes de TV nos brindam é uma espécie de tortura (sei bem do que falo, já que fui “submetida” a cerca de duas horas de visionamento difuso da Casa dos Segredos na passagem de ano). 

Por isso, a minha televisão continua desliga da corrente à espera que eu lhe arranje uma entrada USB, a qual abrirá a porta às minhas séries e aos meus filmes, vistos quando e como eu quero, sem interrupções para publicidade de produtos que eu não quero comprar ou de programas que eu não quero ver. Para ser perfeito, era só conseguir ter uma mira técnica no final da “minha” emissão, acompanhada de boa música!

quarta-feira, janeiro 02, 2013

O Salto


2012 foi o ano do salto. Podia chamar-lhe mergulho, mas prefiro vê-lo como um salto. Um salto para dentro de mim, sem medo de me perder no vazio.

E se a vontade de dar esse salto foi uma decisão consciente - numa tentativa de me conhecer e de ser mais feliz - todo o processo subsequente, embora consciente, não depende da minha vontade e não posso sequer tentar controlá-lo. É uma aventura. Terrível e magnífica. 

Terrível porque me confrontei com algumas coisas que preferiria não ter encontrado em mim. Mas magnífica por tudo o que ganhei em verdade e em autenticidade. Finalmente a imagem projectada no espelho é mais aquilo que Sou e menos a construção racional (a máscara) a que hoje chamo o "sempre fui assim".

Hoje sinto que este salto em busca do Eu é, possivelmente, a maior viagem que algum dia poderei fazer. E uma viagem que nunca acaba, porque é sempre possível ir mais longe e mais fundo. Aliás, esse é o verdadeiro desafio, não parar a incessante busca do Eu e aprofundar o Ser. Encontrar o Eu verdadeiro, fundo, bem fundo, e não o eu que fui construindo, camada após camada, até não ser mais do que um conjunto de certezas inabaláveis e de definições absolutas do "sempre fui assim".

Tornar-me eu mesma, sei hoje, é uma tarefa árdua. Implica deitar fora muitas das coisas que sempre disse e sempre fiz porque "eu era assim". É andar à deriva e, muitas vezes, não saber, de todo, qual é o caminho que quero seguir. É contradizer-me, é aceitar que há mais mundo que quero descobrir, é ter a coragem de viver os meus sonhos, é assumir que posso e quero ser mais e ser melhor. É, também, redescobrir a autenticidade e perder o medo de Ser. É difícil, mas é possível.

Eu quis dar esse salto e mesmo sabendo que ainda tenho um longuíssimo caminho a percorrer, ganhei a serenidade de o ir fazendo, dia a dia, sem querer construir uma nova "máscara" e tornar-me qualquer outra coisa que não Eu. No fundo é este o meu propósito no ano que começa. É simples, mas não é pouco. É uma tarefa para a vida.