O Observador fez um fact check sobre “impostos europeus”, para aferir se estes são fake news e parece concluir que sim. Pelo caminho, mais do que identificar factos, dá opiniões e cria mais confusão do que ajuda a compreender o que está em causa. Indo por partes:
Concorrência fiscal
1. A confusão começa porque o autor assume como má (ou errada) a concorrência fiscal. E isso não é um facto. É uma opinião. Mais, é uma opinião ideologicamente comprometida. Quem acredita num mercado livre em que os Estados competem, de forma saudável, entre si, acredita que a concorrência fiscal é boa e cria eficiência e vantagens para o contribuinte.
2. A confusão continua ao pretender fazer passar a ideia de que a Irlanda, o Luxemburgo ou a Holanda são paraísos fiscais apenas porque têm regimes fiscais mais competitivos. Ora, regimes fiscais mais competitivos não são ilegais e faz parte da soberania dos Estados Europeus (pelo menos enquanto tal existir) definir o seu sistema fiscal.
A este propósito, não deixa de ser curioso notar que, a propósito da descida do imposto sobre empresas em vários estados Europeus, a OCDE acaba por concluir que "the fall in corporate tax rates had not been reflected in a decrease in corporate tax revenues and this as a “paradox". Ou seja, os Estados que optaram por baixar impostos não viram a sua receita fiscal diminuir, mas antes conseguiram aumentá-la. Possivelmente porque atraíram investimento estrangeiro, porque as empresas menos asfixiadas por impostos investiram mais e criaram mais riqueza e postos de trabalho (que posteriormente foram tributados).
A este propósito, não deixa de ser curioso notar que, a propósito da descida do imposto sobre empresas em vários estados Europeus, a OCDE acaba por concluir que "the fall in corporate tax rates had not been reflected in a decrease in corporate tax revenues and this as a “paradox". Ou seja, os Estados que optaram por baixar impostos não viram a sua receita fiscal diminuir, mas antes conseguiram aumentá-la. Possivelmente porque atraíram investimento estrangeiro, porque as empresas menos asfixiadas por impostos investiram mais e criaram mais riqueza e postos de trabalho (que posteriormente foram tributados).
3. Por fim, argumentar que o fim de regimes fiscais mais favoráveis na UE é benéfico para Portugal é desistir de acreditar que Portugal pode ter ele próprio um sistema fiscal mais competitivo, baixar impostos e deixar de sufocar cidadãos e empresas. Com isso, seria possível atrair investimento, criar riqueza, criar postos de trabalho e por a economia a crescer. Possivelmente, até poderíamos sentir o paradoxo de que fala a OCDE: baixar impostos e aumentar a colecta.
Princípio da unanimidade
4. A unanimidade do voto no conselho em matérias chave, como fiscalidade ou defesa, é uma protecção dos Estados. É uma garantia da sua soberania. E, como se compreende, abdicar de uma parte da soberania, ao contrário do que o Documento da Comissão parece dizer, não pode nunca aumentar essa mesma soberania. Esse sim um paradoxo irresolúvel.
5. Acontece, ainda, que defender o fim da unanimidade de voto no conselho e da soberania fiscal não é um facto, mas uma opinião. E, uma vez mais, uma opinião ideológica.
Impostos Europeus
6. Como é evidente, o fim da unanimidade fiscal hoje não significa que haverá impostos europeus amanhã. Ninguém está a dizer isso. Porém, é certo que o fim dessa mesma regra de voto unânime, facilitará a introdução quer do FTT, quer do imposto sobre o digital, e levará, tendencialmente, a uma não desejada harmonização fiscal. (Que alias o autor parece defender ao criticar os regimes irlandeses ou holandeses). A harmonização fiscal, porém, também não é um facto. Quando muito será wishful thinking para alguns.
7. E aqui chegamos novamente a uma questão relevante. Diz o autor “Com isto criou-se a ideia de que está em cima da mesa a criação de impostos europeus para onerar os contribuintes europeus (e portugueses)”. Por um lado, quer o FTT, quer o imposto sobre digital, quer o imposto do carbono aplicar-se-ão, tanto quanto sabemos, a contribuintes europeus e portugueses. Embora sejam empresas, não deixam de ser contribuintes. Mas se por “contribuintes” se quiser apenas entender pessoas singulares, a verdade é que não sendo directamente sujeitos de nenhum imposto, vão acabar por ser onerados por eles. As empresas, sabemos, têm por hábito repercutir os seus custos (nomeadamente fiscais) nos preços que praticam. Quer isso dizer que, no fim do dia, serão os consumidores (europeus e portugueses) a suportar o imposto aplicado quer às transacções financeiras quer às empresas do digital, quer ao carbono.
8. Por último, escreve o autor: “Assunção Cristas vê o imposto às grandes companhias como um cavalo de Tróia para depois serem criados impostos a partir de Bruxelas.”. Ora, a União Europeia é uma construção permanente, que se faz de passos. Assim sendo, é natural que Assunção Cristas diga que ao criar-se hoje um imposto sobre grandes companhias se está a criar um precedente para que amanhã se criem novos impostos. Aliás, a criação de um imposto hoje, servirá sempre de argumento de autoridade para a criação do seguinte amanhã, e nesse momento não servirá de nada invocar a soberania fiscal, porque, seguindo a lógica do autor, já abdicámos dela! Pode ser ainda sobre empresas, ou pode ser sobre fortunas, ou pode ser sobre património. Não sabemos. O que sabemos é que ao permitir hoje que se dê o primeiro passo na criação de impostos a nível europeu sobre grandes empresas, menos autoridade teremos amanhã para os travar quando passarem a incidir sobre todas as empresas ou sobre os cidadãos. Daí ser fundamental travar esta possibilidade e não abdicar do direito de veto.
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