Filiei-me no CDS em 1999 motivada pelo seu então líder, Paulo Portas, mas também por uma escolha ideológica. Claro que a definição ideológica aos 16 ou aos 18 anos é bastante menos matizada que a que temos aos 38 anos. O meu mundo de então era preto e branco. Para mim, havia direita e havia esquerda. Havia socialistas e havia não socialistas. Eu era de direita e não socialista. Ainda hoje, na essência é isso que me define politicamente.
Com a idade, e com a vivência no CDS, fui limando arestas e percebendo que havia pontos em que era mais liberal, questões nas quais seria mais conservadora e que era pouco próxima da democracia cristã. Na essência, o que me motivava, e motiva, é o combate pela liberdade contra o estatismo dirigista das esquerdas.
Nos meus anos de militância activa nunca me perdi em guerras ideológicas nem vi muitos a fazê-lo. Sempre que pude defendi a síntese das várias correntes e a sua união em torno dos valores mais importantes, o primeiro deles a liberdade. O CDS é a nossa casa, sejamos mais liberais, mais conservadores ou mais democratas cristãos. O que nos une é que não somos socialistas e não acreditamos que o Estado resolva todos os problemas. Daqui resulta que o espaço não socialista abrange todos o que acreditam no combate pela liberdade individual: do mais liberal ao democrata-cristão, há espaço para todos.
O meu CDS, aquele em que cresci e em que me fiz politicamente adulta, é pois uma grande casa de liberdade. Uma casa onde cabem todos aqueles que não olham para o Estado como uma entidade salvífica e que acreditam na livre iniciativa e no personalismo. A pessoa faz a comunidade e não é a comunidade que define a pessoa. O meu CDS é o partido que discutiu a flat tax quando ninguém falava dela e defendeu o cheque ensino contra os que nos acusavam de querer acabar com a escola pública. O meu CDS é o partido que apontava a Irlanda como exemplo de crescimento e que se apresentava aos eleitores como o partido dos contribuintes. Ao mesmo tempo, é o partido que não esquecia os agricultores, as forças de segurança, os reformados e os ex-combatentes. O meu CDS é o partido que defendia um Estado mais exíguo e que explicava que serviço público não tem que ser prestado por entidades públicas. O partido que acreditava na iniciativa, no mérito e num verdadeiro “elevador social”. Mas era também o partido que tinha como lema relativo à imigração “rigor na entrada, humanidade na integração” e o partido que defendia a vida.
Esta era uma mistura, para mim quase perfeita, de liberalismo na economia, de tirar o Estado da vida das pessoas, e de um certo conservadorismo social que não sendo ultramontano ou radical partia do princípio que a política não deve ter por objectivo a construção do homem novo ou a engenharia social. Ora, este “meu” CDS não conseguiu aproveitar os últimos 4 anos para se sedimentar, beneficiar da erosão do PSD e abriu o flanco a novas forças políticas. Ontem ficou reduzido à sua expressão mínima e encravado entre uma Iniciativa Liberal que soube vender o mesmo liberalismo, que eu sempre encontrei no CDS, de forma muito mais eficaz; e pelo Chega que agarrou o eleitorado mais conservador com um discurso ideologicamente vincado e um estilo truculento.
O CDS, que se apresentou às eleições com melhor programa eleitoral de sempre, teve ontem o pior resultado (em número de votos) da sua história. E o mais grave nem é ficarmos com um Grupo Parlamentar de 5 (o que de si é trágico) ou passarmos a ser “o maior dos mais pequenos”. O mais grave é que esta derrota, quando e como acontece, pode levar o CDS para um caminho de depuração doutrinária e de combate ideológico que só nos pode fazer pior.
A situação é difícil. Termos a Iniciativa Liberal e o Chega a disputar connosco o nosso eleitorado, todos os dias, com uma versão “simplificada” do nosso discurso não ajuda. Mas pretendermos ser amanhã mais liberais do que a IL ou querer ultrapassar o Chega pela direita não é de todo a solução.
O CDS tem que continuar a ser a casa de conservadores-liberais, misturando as várias tendências numa receita de sucesso, e tem que conseguir recuperar a confiança de quem pretende, de facto, ter uma alternativa não socialista em Portugal. Mais do que discutir quem é mais liberal ou mais democrata cristão, ou qual o grau máximo de pureza ideológica, o CDS tem que ser capaz de se encontrar no que nos une – somos o espaço não socialista – e de assumir um discurso simples que rompa com o estatismo, que devolva a liberdade às pessoas, que se oponha de forma inequívoca a toda e qualquer tentativa de construção social por parte do Estado. O caminho não é fácil e acredito que todos sejam precisos. Desistir não é opção e Portugal precisa, mais do que nunca, daquilo que há mais de 20 me levou ao CDS: uma alternativa não socialista para o país.
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