Eu não gosto do discurso, hoje muito
habitual, do Norte vs Sul da Europa.
Sendo que nesse discurso o Norte é sempre o esforçado, o trabalhador, o
aforrador, enquanto o Sul é o gastador, o baldas e o preguiçoso. Parece-me que não será
com este discurso que a União Europeia vai ultrapassar a crise. Porque é
mentira? Não. Porque esta dicotomia não explica tudo.
Infelizmente, é verdade é que nos anos
do Euro foi de facto isto a que assistimos. Porventura a Grécia nunca deveria
ter entrado na UEM e, possivelmente, os mecanismos de controlo e de vigilância do
cumprimento do PEC deveriam ter sido bem mais apertados. Não apenas para o Sul,
mas para todos. Porque todos sabemos que, quando a França e a Alemanha
ultrapassaram o limite de 3% para o défice, o Conselho decidiu “perdoar” e não
abrir qualquer processo por défice excessivo. A UE foi branda e as suas regras
foram frouxas. Começaram a construir uma casa pelo telhado (Euro) e, com isso,
demos todos um passo maior do que a perna.
No
meio de tudo isso, o modelo explicado por BradfordDeLong fez sentido e trouxe, na verdade, prosperidade à UE. O Sul financiou-se à
custa do Norte e, com isso, a vida dos cidadãos melhorou (ainda que de forma
fictícia). O dinheiro ficou mais barato, as importações também e os salários
aumentaram. Nada foi feito do lado da competitividade. Não apareceram novas
indústrias, não se apostou nas exportações, não se apostou na formação dos
cidadãos. Pelo contrário, quais novos ricos embriagados pela súbita
sorte grande, gastou-se mais do que se tinha em bens desnecessários (aqueles que
no futuro só representam dívida e nada mais).
Verdade? Para o caso que conheço
melhor – Portugal - foi assim. É verdade. Mas terá sido verdade para Espanha?
Lembro-me do espantoso crescimento económico espanhol sob a batuta de Aznar,
apontado como referência e como modelo. Também Espanha caiu na recessão com
estrondo. E hoje não é apenas o sul que apresenta desequilíbrios excessivos.
Olhe-se para a Irlanda, o tigre celta, que caiu e está hoje a braços com um
programa de ajustamento financeiro semelhante ao nosso. Veja-se o caso da
Bélgica, país do centro da Europa, no núcleo duro do Benelux, a braços com
gravíssimos desequilíbrios. Terá sido o modelo de crescimento Irlandês e
espanhol errado? Terá a Bélgica comportamentos de país do Sul? A Irlanda não
apresentava problemas de competitividade anteriores à crise, antes pelo contrário.
Era, ao inverso, o Estado com o sistema fiscal para empresas mais
competitivo dos 27. E mesmo assim caiu.
As
causas da crise – como também diz BradfordDeLong – são várias. Aliás, não há uma crise, mas várias crises sobrepostas e
sucessivas. A que chegou à Irlanda e a Espanha é a crise do sistema bancário,
criada pela excessiva alavancagem dos bancos. A portuguesa, pelo contrário, é
uma crise de excesso de dívida. E, naturalmente, para problemas diferentes as
respostas têm elas mesmas que ser diferentes. Não podemos querer simplificar
tudo com o discurso Norte vs Sul, porque ainda que em alguns casos seja verdade,
não dá resposta a todo o problema. E se a UE quer sair deste ciclo recessivo
mais forte e mais robusta, será apenas com mais solidariedade entre Estados e
com mais responsabilidade de cada Estado.