sábado, outubro 13, 2012

O véu pintado



Tenho por hábito estudar/trabalhar ao som de bandas sonoras. Calhou hoje a escolhida ser a fabulosa banda sonora do filme “The Painted Veil”, de Alexandre Desplat. O que me levou a recordar o filme e o livro, de Somerset Maugham. Este é, possivelmente, o escritor homem que melhor captou a riqueza de uma personalidade feminina. As suas mulheres nada têm de planas, previsíveis ou secundárias. Antes pelo contrário. E n' “O Véu Pintado” é uma mulher a anti-heroína na história. 

Kitty Fane começa por ser a menina fútil e evolui para ser uma mulher leviana. Mas, a mesma Kitty Fane que assim começou, através de um caminho de solidão e de sofrimento, consegue redimir-se e regenerar-se. Confrontada com as suas culpas, com a solidão e com o desterro numa zona remota da China, Kitty renasce primeiro para os outros (as freiras e os orfãos do convento) e neles encontra-se, depois, a si própria. E, por fim, descobre o afecto, o perdão e o amor pelo homem que outrora desprezara. Um amor que nasce do respeito e da admiracão, mas também do sofrimento. E um amor que é muito mais do que uma paixão fugaz, alimentada pela chama passageira do desejo e da auto-satisfação. Um amor capaz de vencer a solidão, a descrença e até o medo, porque se basta a si próprio, pelo poder regenerador e criador que traz consigo. 

Esta é a poderosíssima estória que Somerset Maugham nos conta, e Kitty Fane acaba por ser a derradeira prova de que não há caminhos impossíveis e que o sofrimento tem um imenso poder regenerador, saibamos nós aproveitá-lo. Kitty Fane é, afinal, uma lição de esperança nas mulheres. Uma lição de esperança no ser humano.

Como escrevi certa vez, esta é uma estória de amor do avesso. Talvez a mais bela estória de amor do avesso já contada... mas, lá está, também ninguém nos disse que as estórias de amor tinham todas que ser escritas do direito. Somerset não o fez. E fez bem.

Nenhum comentário: