Durante os dias de ontem e de hoje recebi vários telefonemas e contactos de militantes, e de pessoas que nada têm que ver com o CDS, a pedirem-me uma explicação sobre o que se está a passar. Explicação essa, entenda-se, jurídica e política.
Deixando de parte as histórias menos bonitas de agressões e insultos (que as cassetes de vídeo podem esclarecer e os tribunais julgar) e não me pretendendo sobrepor ao parecer da Jurisdição, que estamos a aguardar, gostaria de esclarecer algumas coisas que me parecem pertinentes (uma espécie de FAQ's do CDS):
1.º O requerimento com mil assinaturas, de que tanto se fala, o que é, realmente?
O requerimento de que se fala consubstancia um direito que os militantes têm de pedir a marcação de um Congresso (artigo 39.º dos Estatutos). Esse requerimento não pode ser rejeitado pelo Conselho Nacional mas por si só não convoca o Congresso. Essa convocação e a aprovação do respectivo regulamento é feita em Conselho Nacional convocado para esse fim (Artigo 43.º, n.º 1 b) dos Estatutos).
2.º O requerimento poderia ser discutido em Óbidos?
O requerimento para convocação de Congresso não poderia ter sido discutido em Óbidos. O requerimento que, segundo creio, foi recebido pela senhora Presidente do CN na sexta feira, dia 16, obriga-a a convocar, de imediato, um Conselho Nacional com ponto de ordem de trabalhos a marcação de um Congresso, CN no qual o requerimento nem sequer é discutido, mas meramente executado. De todo o modo, uma coisa é certa, o Requerimento não pode ser acrescentado à Ordem de Trabalhos já definida de um Conselho Nacional Extraordinário já (anteriormente) convocado, para fins diferentes daqueles a que o requerimento se destina
3.º Mas a marcação de congresso não estava já prevista na Ordem de Trabalhos do CN de Óbidos?Estava, mas a pedido da Comissão Política Nacional. No mais estrito formalismo, estaríamos perante o pedido de convocação de dois Congressos. Um pela CPN outro por 1000 militantes. Contudo, a diferença é que a proposta da CPN pode ser rejeitada pelo voto da maioria dos Conselheiros.
4.º O que aconteceu à proposta da CPN de convocação de um Congresso?
A proposta da CPN foi chumbada pela maioria dos Conselheiros Nacionais.
5.º O que foi, afinal, posto a votação no Conselho Nacional?
Foram postas a votação 2 propostas: a primeira pedia a convocação imediata de um Congresso, sendo que foi rejeitada. A segunda colocava três hipóteses (i) convocação imediata de eleições directas; (ii) convocação de congresso estatutário seguido de eleições directas; (iii) convocação de congresso electivo. A opção (i) ganhou com 65% por votos.
6.º Mas a eleição directa do líder é legal?
Segundo o parecer unânime do Conselho Nacional de Jurisdição, o órgão de controlo a que compete julgar (artigo 57.º dos Estatutos), é perfeitamente legal o Conselho Nacional votar a convocação de eleições directas. «O Conselho de Jurisdição do CDS-PP decidiu que o Conselho Nacional do partido pode aprovar a realização de eleições directas imediatas, quer integrando-as nos estatutos quer através de uma norma transitória.».
7.º Qual a maioria necessária para aprovar as directas?
Os Estatutos e regulamentos são, quanto a isso, omissos.
8.º Na omissão de uma regra sobre a maioria necessária, o que se aplica?
Quando a lei é omissa no tipo de maioria exigida, em princípio, aplicar-se-á a regra de que a maioria simples é suficiente. Mais, existe o precedente de umas eleições directas já terem sido anteriormente aprovadas pelo Conselho Nacional (no CN de Gaia, em Maio de 2005) por maioria simples.
9.º As directas ganharam, e agora?
A forma de eleição directa do Presidente do Partido ganhou, efectivamente, a votação em Conselho Nacional, de forma perfeitamente legal. Assim sendo, o Conselho Nacional teria que aprovar o regulamento para essa mesma eleição. Não o tendo feito não deu cumprimento à decisão do Conselho Nacional.
10.º O que acontece, então, ao requerimento das 1000 assinaturas a pedir Congresso?
O requerimento será objecto de análise e executado num outro Conselho Nacional, expressamente convocado para esse efeito. Assim sendo, e tendo em Óbidos vencido a solução das directas, o requerimento em nada seria prejudicado, uma vez que é possível conciliar o Congresso com as directas aprovadas pelo Conselho Nacional. O Presidente será eleito por via directa e de seguida teremos o Congresso para dicutir e aprovar Moções de Estratégia e a composição dos órgãos. Esta seria a cronologia correcta que em nada viola os Estatutos e em nada fere o pedido dos militantes.
11.º Os militantes quando pedem a convocação de um Congresso podem estabelecer o tipo de congresso, a data ou a sua ordem de trabalhos?
Não. A competência para aprovação do Regulamento é exclusiva do Conselho Nacional.
12º No meio de tudo isto, para que servem as 2000 assinaturas recolhidas a favor das directas?
Ao contrário do que se passa com a convocação de um Congresso, não é, neste momento, dado aos militantes o direito estatutário de requerer a convocação de eleições directas. Porém, estas 2000 assinaturas têm o valor político de fazer saber que a grande maioria das estruturas (Distritais e Concelhias) está a favor da proposta feita pelo Dr. Paulo Portas.
13.ª As decisões da Presidente da Mesa do Conselho Nacionais são recorríveis?
Compete especialmente ao Presidente em exercício: admitir ou rejeitar propostas, reclamações e requerimentos, sem prejuízo do direito de recurso dos seus autores ou subscritores para o Plenário do Conselho Nacional (Artigo 8.º d) do Regimento do Conselho Nacional); das deliberações da mesa cabe recurso para o Plenário do Conselho Nacional (Artigo 12.º número 2 do Regimento do Conselho Nacional), e ainda, das decisões do presidente e das deliberações da Mesa, quando umas e outras forem tomadas no uso de poderes discricionários cabe recurso para o plenário do Conselho Nacional (Artigo 64.º, número 1 do Regimento do Conselho Nacional).
14.ª As propostas têm, efectivamente, que ser apresentadas com 5 dias de antecedência?
Segundo o Regimento do Conselho Nacional estamos perante duas possibilidades: (i) apresentação de propostas já previamente reduzidas a escrito com 5 dias de antecedência; (ii) apresentação de propostas no decorrer do debate dos pontos da ordem de trabalhos. De todo o modo, sendo o Conselho Nacional de Óbidos um Conselho Extraordinário, convocado com urgência, a própria convocatória não terá chegado com 5 dias de antecedência, obstando, desde logo, o cumprimento da regra do artigo 21.º do Regimento. Acresce que, também neste ponto, há vários precedentes que comprovam que é possível a apresentação de propostas no decorrer do Conselho Nacional. Assim sendo a decisão correcta seria a de aceitar a discussão da proposta subscrita pelo Conselheiro Paulo Portas e outros.
15.ª Houve um assalto ao poder?
Não. Houve a discussão e votação de duas propostas legítimas e legais (uma da Direcção e outra do Dr. Paulo Portas) e uma vitória, legal e expressiva desta última. A proposta de Paulo Portas venceu. Não há qualquer outra interpretação possível que não ponha em causa, de forma irremediável, a verdade dos factos.
16.ª O que fazer agora?
Foi pedida a intervenção do órgão próprio (Conselho Nacional de Jurisdição) para decidir qual a interpretação que deve prevalecer, de acordo com a legalidade estatutária: (i) se a decisão de que o Requerimento prevalece e como tal inviabiliza a decisão do CN; (ii) se a decisão do CN prevalece (como nos parece) e como tal o Requerimento com ela deverá ser conciliado.
17.ª Politicamente, que leitura podemos fazer de tudo isto?
Fora de todas as questões jurídicas, que julgo terem sido explicadas nos 16 pontos supra enunciados, a questão política que está no centro deste debate é sabermos que rumo o CDS quer tomar. Neste momento há duas vias (i) manter a actual liderança, que está no cumprimento do seu mandato, mas que claramente fracassou ou (ii) estar ao lado do Dr. Paulo Portas, que se assumiu como o rosto da alternativa. E politicamente parece-me que, neste momento, já não restam dúvidas de qual o rumo que a grande maioria dos militantes pretendem seguir. Temos um abaixo assinado a apoiar as directas que foi subscrito por 73% das estruturas locais, temos uma vitória expressiva em Conselho Nacional, temos perto de 2000 militantes que participaram em jantares com Paulo Portas, manifestando-lhe o seu apoio, temos um partido que anseia pela mudança e que quer Portas de volta. Este é o sentimento, esta é a realidade do CDS. A direcção ao não ver (ou ao não querer ver) está a cometer um erro clamoroso que só arrasta o CDS para uma situação de guerra civil, na qual o poder instalado se recusa a sair, apesar da evidência de que a sua guerra contra a mudança está perdida.
Juridicamente, parece-me que a razão está do nosso lado, politicamente tenho a certeza que Paulo Portas é a solução preferida por 4/5 do CDS . A Ribeiro e Castro convém recordar que, num partido democrático, contra a vontade livre dos militantes, não há argumentos.